Adeildo Vila Nova

Capítulos de livros

Racismo e violação de direitos humanos das juventudes: a juventude negra na mira do Estado Penal

Capítulo VI - Racismo e violação de direitos humanos das juventudes: a juventude negra na mira do Estado Penal

No Brasil, o índice de violências contra a juventude negra tem atingido taxas alarmantes e precisamos encarar essa realidade que se apresenta no nosso cotidiano, questão facilmente verificável por meio das grandes mídias e redes sociais, além das diversas pesquisas acadêmicas que têm sido desenvolvidas sobre essa temática. De acordo com o Relatório do Índice de Vulnerabilidade da Juventude à Violência (2017) elaborado pela Secretaria Nacional da Juventude, as taxas de mortalidade demonstram que os jovens negros se encontram em situação de maior vulnerabilidade social, bem como entre as maiores vítimas de homicídio. O documento aponta ainda que essas mortes têm uma geografia e um endereço certo, já que se trata dos/das jovens, sobretudo das periferias, que estão mais expostos/as à violência do Estado. Inegável é o destaque de que o Estado brasileiro  tem se constituído, cada vez mais, em um Estado Penal/Policial e que, em meio à constante destruição das políticas sociais características de um Estado de bem-estar social, em vez de dar atenção a esse público com a elaboração de políticas públicas,  tem ofertado como resposta a adoção de práticas repressivas promovidas pela polícia e a criação de instrumentos legais para discriminar e criminalizar a população pobre e preta dessas periferias, causando ainda mais violência, tensão e instabilidade social. Nesse contexto, há também a cor de pele preferencialmente atingida, a cor preta, que está sobrerrepresentada nas periferias dos grandes centros urbanos e diretamente relacionada com o grau de exposição às violências às quais esses/as jovens estão submetidos/as, especialmente a violência policial, com suas ações truculentas e arbitrárias. 

O beija-flor que brada as asas da liberdade:  femenagem em memória de Andrea Almeida Torres

Capítulo IX - O beija-flor que brada as asas da liberdade:  femenagem em memória de Andrea Almeida Torres

Andrea tinha 50 anos e faleceu em 31 de agosto de 2019, em decorrência de complicações hospitalares no trato de intercorrências oriundas de seu delicado quadro de saúde e manutenção de transplante de fígado, que realizou com êxito há 12 anos. Era vice-coordenadora do curso de Serviço Social da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), curso que compunha como docente há nove anos, docente do Programa de Pós-graduação em Serviço Social e Políticas Sociais da Unifesp, coordenadora do Grupo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Sociedade Punitiva, Justiça Criminal e Direitos Humanos (GEPEX.dh) e referência na profissão na área de sistema prisional-penal, criminologia crítica, abolicionismo penal e direitos humanos. O título dessa femenagem é alusivo ao que Andrea Almeida Torres acreditava, na maior dialética possível entre a teoria de quem ela era e a práxis que a materializava nesse mundo: o beija-flor, pássaro que representa as cores vívidas, o voo sem grades, com delicadeza e também com uma grandeza mesmo em sua pequenez física; pássaro esse, com sentido e significado, tatuado no peito dessa mulher, consolidando assim a importância de compreender que uma vida contra as prisões é muito mais do que sobre a concretude de um sistema penal-prisional, como já dizia Passetti (2004), é sobre abolir o castigo, as grades e as punições de dentro de si. E, claro, a liberdade, princípio ético político fundamental da profissão da/o assistente social, categoria que luta pela emancipação humana e política da classe trabalhadora - liberdade esta que só se dá em outra ordem social: algo que Andrea não só acreditava, como também nos ensinava todos os dias, desde sua prática mais singela pelos corredores da Unifesp, campus Baixada Santista, ao ir tomar um café na cantina, até mesmo em suas aulas sobre Ética Profissional, dialogando com a luta intransigente pela defesa dos direitos humanos.

Capítulo IV - Racismo é maus-tratos: o ECA e a proteção às crianças negras

Capítulo IV - Racismo é maus-tratos: o ECA e a proteção às crianças negras

Pensar o racismo no Brasil é um grande desafio considerando o processo  histórico de colonização e escravização que mancham a nossa formação sócio histórica e que a elite burguesa, ou aburguesada, do nossso país insiste em não reconhecer sua existência e as consequências nefastas sobre a vida de trabalhadoras/es negras/os brasileiras/os. Especialmente quando ainda pouco se discute, em termos acadêmicos, políticos e sociais, a incidência do racismo e seus rebatimentos na infância negra brasileira. As discussões sobre o racismo no Brasil se configuram numa arena de disputas ideológicas, políticas e acadêmicas. São inúmeras as tentativas de conceituar, de buscar termos que sintetizem e expliquem de maneira objetiva a questão racial e seus desdobramentos na vida cotidiana e objetiva da população brasileira (SANTOS, 1984; GUIMARÃES, 2009; CARNEIRO, 2011; ALMEIDA, 2021). Negros são as maiores vítimas de homicídios no Brasil. Segundo o Atlas da Violência (2019), em 2017, 75,5% das pessoas assassinadas no país eram pretas ou pardas – o equivalente a 49.524 vítimas. A chance de um jovem negro ser vítima de homicídio no Brasil é 2,5 vezes maior do que a de um jovem branco. Negros também é maioria entre os que morrem em decorrência de ações de agentes de segurança do Estado. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2019), 74,5% das pessoas assassinadas em intervenção policial são pretas ou pardas. As mulheres negras são vítimas mais recorrentes de homicídios. Segundo o Atlas da Violência (2019), a taxa de assassinatos dessas mulheres cresceu 29,9% de 2007 a 2017. No mesmo período, o índice de homicídio de mulheres não negras  cresceu 4,5%. As mulheres negras são o principal grupo de risco nos casos de feminicídio. Os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2019) mostram que 61% das mulheres que sofreram feminicídio no Brasil eram negras.

Racismo estrutural e a infância negra no Brasil:  apagamento e invisibilização

Capítulo II - Racismo estrutural e a infância negra no Brasil:  apagamento e invisibilização

Discutir o processo de colonização no Brasil a partir de uma perspectiva crítica é entender as relações sociais estabelecidas entre as populações que compunham os residentes do país e suas expressões a partir das relações sociais e econômicas instituídas e instauradas naquele determinado período, mais especificamente entre os séculos XVI e XIX. Nunca é demais lembrar que o Brasil foi o último país no mundo a abolir a escravidão. E isso não se configura como mera coincidência ou obra do acaso. Esse retardamento em extinguir o sistema escravocrata trata-se de uma forma deliberada de explorar ao máximo a força de trabalho escravizada disponível à época e assim obter o maior lucro possível sobre essa forma cruel e desumana de exploração e de expropriação das riquezas nacionais. Tanto é verdade que somente quando o sistema escravocrata se mostra insustentável, política e economicamente, é que o Brasil decide pela abolição, assinando, em 13 de maio de 1888, a tão propalada Lei Áurea, constituída apenas de dois artigos: um que trata expressamente da extinção da escravidão no Brasil e outro dizendo que revogam-se as disposições em contrário. No bojo dessa decisão adotada pelo Brasil no final da segunda metade do século XIX, milhares de homens e mulheres escravizadas(os) foram dispensadas(os), ou melhor dizendo, descartadas(os) do processo de reestruturação política e econômica que se iniciava com a abolição da escravatura, ou seja, a substituição da mão de obra escravizada pela mão de obra livre, do trabalho compulsório e escravizado para o trabalho livre e assalariado. Um verdadeiro, longo e cruel processo de exclusão desse segmento populacional negro recém-liberto que contou com um aparato legal que justificasse todas as atrocidades que continuariam a ser impostas a essa população. 

Infâncias, educação infantil e relações étnico-raciais

Capítulo IV - Infância negra no Brasil, racismo e violação de direitos humanos: a educação para as relações etnico-raciais e os desafios para uma educação antirracista

A infância negra no Brasil foi e ainda é atravessada por uma série de circunstâncias que a expõe aos mais diversos fatores de riscos. Riscos estes resultantes em diversas violações dos seus direitos fundamentais estabelecidos em estatutos legais como a Constituição Federal de 1988, culminando na promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990. Partimos da ideia de que o racismo é um dos fatores que agravam seriamente as condições socioeconômicas dessas crianças e consequentemente as violações sofridas. Apontamos neste capítulo que, entre esses direitos violados, a educação se coloca como algo ainda pouco discutido, especialmente quando nos referimos especificamente à educação de crianças negras; haja vista o histórico de exclusão escolar desse segmento populacional, o qual se estabeleceu ainda no Brasil colonial, mas que ainda é recorrente na atualidade, como descortinaremos no desenvolvimento desse estudo. Iniciativas como a da Educação para as Relações Étnico-raciais (ERER) se colocam como uma ferramenta importante para estabelecer um currículo apropriado e que garanta o respeito às diversidades históricas e culturais dos povos constitutivos do nosso país, com destaque para o povo negro que fundou as bases para o Brasil que temos hoje. Levar essa perspectiva na nossa formação sócio histórica é fundamental para entender nossas origens e valorizar quem, de fato, carregou e carrega esse país nas costas.

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